Filme: Den goda viljan. Mulher: Anna Bergman
(IMDb)
Se actrizes como Liv Ullmann, Ingrid Thulin ou Harriet Andersson ficaram famosas pelos seus brilhantes desempenhos em filmes como Cries & Whispers, The Silence ou Persona isso deve-se em igual parte ao seu talento e à coordenação de Ingmar Bergman. O fascínio e inspiração que o cineasta absorvia das mulheres que o rodearam ao longo da sua vida foram influentes no protagonismo prestado às personagens femininas, cujas frustrações, desejos, medos e pontos fortes foram frequentemente abordados com uma honestidade sem paralelo. Um dos casos mais paradigmáticos na minha opinião é a ficcionalização da sua própria mãe em The Best Intentions, filme que não teve força, coragem ou vontade de realizar, e que retrata os primeiros anos em conjunto dos pais na Suécia do início do séc. XX, desde que se conheceram até ao nascimento do segundo filho… Ingmar.
Anna é apresentada como uma jovem temperamental, rica e bonita, que foi educada a pensar por si, a instruir-se e a trabalhar, o que maravilha e assusta Henrik, estudante pobre num seminário, que tem uma visão mais realista da vida, tendo sofrido na pele muitas contrariedades, mas também mais tacanha e arrogante. São duas pessoas que, ao longo de mais de cinco horas, passamos a conhecer de dentro para fora, que, graças à paciência do argumento e de Bille August na realização, vemos na intimidade e percebemos de onde vêm e, por isso, é fácil apontar-lhes falhas sem deixar de os admirar e querer continuar a seguir - cria-se um sentimento de familiaridade. Assim, a evolução de Anna é palpável e tratada com o mesmo grau de respeito e detalhe que o cinema parece, tantas vezes, conseguir associar apenas a personagens masculinas.
Se no início se assume como mimada e sonhadora, o controlo tóxico da mãe, a morte do tolerante pai, a doença e os revés da sua relação com Henrik vão-na tornando mais forte, mas também ameaçando a sua espontaneidade e beleza natural. Torna-se mais ponderada a falar e as rugas aparecem aos poucos, evidenciando o peso das concessões que vai aceitando para criar o seu futuro e o quão difícil é fazê-lo sem perder noção de quem é. Nesse sentido, Pernilla August dá ao papel toda a credibilidade e as nuances que este exige. Estamos a falar de uma mulher autossustentável numa altura em que nem sequer podia votar, por isso quando Anna exige ao marido que pare de pensar apenas nele para tomarem decisões juntos está a materializar audazmente um apelo muito pessoal. The Best Intentions é um filme de época que, mais do que relatar os amores e desamores de um casal, explora a divisão equitativa de responsabilidades na intimidade e o papel da mulher numa família e numa sociedade em geral.
Obrigado pelo convite, Sofia! Este é um dos meus filmes preferidos de sempre e espero que esta análise seja interessante no tema e que motive mais gente a vê-lo :)
ResponderEliminarOs três filmes que citas no inicio do texto constam nos meus preferidos. Este ainda não vi (aliás, nem conhecia), mas pelo texto parece-me uma boa escolha.
ResponderEliminarCumprimentos,
Rafael Santos
Memento mori