14/12/2015

Spectre | Sam Mendes. 2015

Ideal para ver em caso de insónias sem ter que recorrer a Valdispert Noite.




Spectre tanto pode ser o último filme de Daniel Craig como James Bond como de Sam Mendes como realizador, o que talvez - e sobretudo no que diz respeito ao realizador - não seja uma má decisão. Este último filme da saga James Bond mostra sinais de desgaste, tanto nas cenas de acção "à Bond" como na ausência dos detalhes característicos "da marca" mas sobretudo nos diálogos e nos momentos que se pretendem mais emotivos. O James Bond de Craig parece fora do ritmo - facto que aqui entre nós - torna o ritmo do filme bastante sofrível. 


Os filmes de James Bond não são destinados a desafiar a inteligência das audiências, mas Spectre põe a nossa paciência em teste ao oferecer-nos um agente especial que parece não ter ideia nenhuma de quem é ou do que o motiva a acção.

A parceria de Mendes e Craig elevaram a fasquia da saga com Skyfall, o que lhes deixou a difícil tarefa de superar aquele que é um dos melhores filmes de Bond. Com Spectre, tanto o realizador como o actor não só não superaram as expectativas como nem sequer ofereceram ao público um filme melhor do que o Casino Royale

Os minutos iniciais de Spectre são extraordinários. As cenas passadas na Cidade do México durante o Dia dos Mortos fazem jus ao que se espera do melhor agente do mundo. Acção, cenas física e cientificamente impossíveis, resultados inexplicáveis - o normal. Bond persegue um vilão por entre uma multidão de gente. Prédios caem e um helicóptero é palco de boas e competentes cenas de acção. 

Depois desta sequência alucinante, o filme entra em queda livre. A partir daqui, se alguém consegue identificar Bond (no sentido total do termo) e perceber como todas as voltas e reviravoltas (de duas horas e meia de filme) estão interligadas, aplaudo-vos de pé. 

Em Skyfall, Mendes foi capaz de estabelecer cenas de acção e motivações que fizeram sentido e que ao mesmo tempo que satisfizeram os fãs de Bond deram a algumas personagens sentido e vivacidade. Em Spectre, tudo é feito com o intuito de colocar as personagens em determinadas situações com a  finalidade de criar (forçadamente) cenas de acção. Regras são quebradas, as personagens passam por mudanças de personalidade num "piscar de olhos" e o próprio Bond apenas ocasionalmente faz jus ao charme sexy do super agente que conhecemos desde sempre e que admiramos. 

Por causa de todas as coincidências impossíveis da história (supostamente) intrincada e de ligações impossíveis impingidas em cenas supérfluas, existem determinados momentos do filme que provocam desconforto ao espectador. Refiro-me especialmente à utilização (palavra colocada com sentido pejorativo e bastante critico ao realizador) de Monica Bellucci no filme. Aquela que é uma das mulheres mais bonitas do mundo e uma actriz bastante talentosa limita-se a interpretar uma viúva que depois de enterrar o marido e de correr risco de vida dá uma queca com Bond. A rapidinha até podia ter interesse se existisse alguma ponta de empatia entre os actores mas tal não existe. Culpa do argumento escasso que deram a Bellucci? Talvez.










Em Spectre, a interpretação de Bond não dá a Craig momentos em que deve aliar a masculinidade de um agente à sensualidade delicada de alguém que foi criado para usar fatos de três peças Tom Ford sem os amarrotar. Mas (graças a todas as divindades do Panteão grego) Craig é competente nas cenas de acção. Ao contrário de Christoph Waltz, Ralph Fiennes e de Naomi Harris que são meros adereços barrocos. Cabe a Ben Whishaw como Q. levar a cabo de forma competente os momentos mais leves do filme. Léa Seydoux como Madeleine Swann não me convenceu. Sim está sempre lindíssima, sim interpreta o papel de uma mulher independente e destemida, sim é alguém que entende o mundo de Bond, mas além de ser uma personagem inexpressiva - que merda Sam Mendes - nenhuma mulher consegue auto-pintar as unhas de forma competente num comboio de alta velocidade em andamento. 

Christoph Waltz interpreta um vilão com muito potencial mas que pela estranha e complexa relação familiar que tem com Bond afunda qualquer possibilidade de sucesso ou de competência da interpretação.  Waltz parece estar eternamente preso nos maneirismos de The Inglourious Basterds. Ao competente Moriarty de Sherlock, ou seja, ao actor Andrew Scott nunca é dada a hipótese de brilhar ou de sobressair e não me vou dar ao trabalho de aniquilar a presença do não-falante Dave Bautista

Será que Sam Mendes e os autores foram raptados por aliens e que quem tomou as rédeas do projecto Spectre foi o Gustavo Santos durante os intervalos do Querido, Mudei a Casa? De onde apareceu este filme lamechas, chato, sem vida e inexplicável no que à história diz respeito?

O trabalho feito ao longo dos últimos anos para reinventar com sucesso a personagem de James Bond foi pela sanita abaixo. Spectre é preguiçoso, sem química entre algumas personagens, com uma única cena de acção memorável (e vou ignorar o facto do filme ter uma das perseguições de carro mais desinteressantes e longas de sempre). Até a escolha do tema musical principal e do interprete do mesmo foi uma grande falha. 

Este filme é tão assustadoramente mediano que quanto mais nos esforçamos por desconstruí-lo na nossa cabeça, pior se torna. Uma grande desilusão. 

Veredicto: é possível dormir 135 dos 148 minutos (de duração total) sem ter peso na consciência. 




1 comentário:

  1. Tenho de dizer que concordo contigo mas nem tanto. Eu gosto da maior parte do filme, em especial da acção, o início está estupendo mas quando chega à Áustria o enredo começa a desandar gravemente, tipo bolo a afundar-se no forno. A miúda é insossa (e realmente quem é que pinta as unhas no comboio a meio de uma noite de amor com o James Bond? porque ela tem as unhas nude, depois vermelhas, e na manhã seguinte são nude outra vez), o Andrew Scott é bom mas demasiado óbvio (claro que o Moriarty tinha de ser dos maus), e o Blofeld é uma desgraça só salva pela interpretação do Christoph Waltz que faz o que pode. Irrita-me esta mania de criar historinhas trágicas de origem para todas as personagens icónicas do cinema. Já me basta ter visto os pais do Batman a morrer trinta vezes. Vamos lá pensar bem: então o Blofeld manda na organização criminosa mais poderosa do mundo, tem todo o dinheiro e poder. E o que é que o Blofeld faz? Vai atrás do Bond porque o papá gostava mais do Bond que dele.

    É quase tão mau como a história de origem do Darth Vader na prequel trilogy... (e olha que eu sou uma suprema fanática de Star Wars)

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